Desde 2014 que a Rua da Alegria acolhe um espaço de programação independente, “autogerido e programado de forma livre” pela associação Salto no Vazio. Procura transmitir as vibrações (boas) que o dia a dia lhes traz e contaminar o próximo. A 20 de novembro inaugura uma nova exposição de Ângela Ferreira, depois de ter inaugurado uma mostra coletiva na Casa das Artes, no passado fim de semana. Uma oportunidade para visitar mais um dos espaços culturais da cidade apoiados pelo programa Criatório.
No coração de uma rua com nome de sentimento (bom), o célebre “quem vem e atravessa o rio” dá lugar, neste caso, a “quem vem e atravessa a rua”.
Porque quem passa nesta via do centro do Porto não fica indiferente à montra, às imagens que a ocupam, que contagiam, que perturbam e que, em muitos casos, contaminam.
Quem vem do outro lado da rua não passa, assim, sem lá parar. Atravessa-se a rua e ali está o espaço, já com sete anos de vida.
O Sismógrafo nasceu, primeiramente, através de uma associação cultural e apenas depois surgiu o espaço físico de apresentação (e aqui a equação de “quem nasceu primeiro, se o ovo ou a galinha”, tem, afinal, uma resposta exata).
“A inspiração tanto nos chega de Yves Klein como de Aby Warburg, que entende a tarefa do historiador como a atividade de um sismógrafo, aquele que sinaliza os instantes singulares do presente e os liga a uma tradição”, revela Rita Senra, um dos elementos do (extenso e criativo) coletivo responsável pelo espaço.
E assim, através das referências e como consequência lógica de uma “juventude inquieta”, surgiu o Sismógrafo, espaço independente com propósitos claros de “pensar a arte numa época onde a cultura aparece associada à indústria, problematizando os modos de apresentação pública de objetos e ideias, num tempo de um empobrecimento da experiência e da receção”.
Resumindo, um espaço de pensamento claro sobre processos e consequências de um tempo, o nosso, como instrumento de projeção de um futuro próximo.
Coletivo com diferentes experiências
O Sismógrafo produziu já mais de 100 atividades diferentes desde 2014, envolvendo diretamente mais de uma centena de artistas (locais, nacionais e internacionais).
Aliás, grande parte do núcleo (extenso e criativo) que faz parte ativa desta associação deriva de campos artísticos.
“A equipa conta com diferentes elementos, essenciais pelas suas especificidades: filósofos, designers, artistas visuais e membros ligados à música experimental”, esclarece
Rita Senra, acrescentando que “cada elemento traz consigo diferentes experiências e ferramentas, quer relativas ao pensamento e à prática da arte contemporânea, quer no que diz respeito à montagem e produção de exposições”.
Atualmente, o coletivo (mais ativo) é composto por E
mídio Agra, Hernâni Reis Baptista, João Pedro Trindade, Irene Rodrigues, Maria João Macedo, Pedro Huet, Rita Senra, Rodrigo Camacho, Sara Rodrigues e Susana Camanho.
O espaço é apoiado pelo programa municipal Criatório, tendo em vista a programação a ser desenvolvida no local.
Atividades em dois polos
Mas o alcance do Sismógrafo cresceu ao longo dos anos e, para além da produção em casa própria (na Rua da Alegria), a equipa é responsável também pelas exposições patentes na Casa das Artes, na Rua Ruben A.
Aliás, no sábado passado, 6 de novembro, foi inaugurado “O sol seguido de o mais velho, da ovelha e de the origin (on and on), conduzidos por klecks klecks", exposição coletiva com Rudi Brito, Rita Caldo, João Gil, Anna Szaflarski & Remko van der Auwera. Pode ser visitada até 31 de dezembro.
Mas um dos pontos altos da programação acontece já no dia 20 de novembro, a partir das 15h00, com a inauguração de "Mais pesado que o céu", de Ângela Ferreira (e que pode ser visitada até 18 de dezembro).
Com entrada livre, esta nova exposição reúne trabalhos da artista e segue a lógica e linha de programação definida para estes anos, a de mudança iminente com as circunstâncias da realidade atual.
“Muitos veem estes momentos de crise como uma oportunidade para o despertar político, para a transformação social. Que reação desencadeia este momento histórico na prática artística?”, lançam, logo complementando: “Como respondem os discursos artísticos às alterações climáticas, à gentrificação, à violência sexista de uma sociedade em que o patriarcado e o neoliberalismo formam uma aliança que aposta pela submissão, pela discriminação, pelo binarismo de género, pelo ódio ao diferente, pelo racismo institucional, por muros e fronteiras, por novos colonialismos, por uma tentativa de se apoderar de toda a produção, arruinando e subordinando o trabalho de reprodução social?”, admite o manifesto lançado pelo coletivo para este ano de programação.
As atividades já programadas procuram assim abordar estas ideias, procurar respostas às questões levantadas e, acima de tudo, contagiar com as vibrações que só um sismógrafo (ou este Sismógrafo) é capaz de fazer.
O espaço pode ser visitado de quinta-feira a sábado, das 15h00 às 19h00. Toda a programação pode ser consultada em http://sismografo.org.