20/05/2024

Na manhã em que as atletas Ana Marinho, Rafaela Fonseca e Dulce Félix subiram ao pódio da 18.ª Corrida da Mulher, mais de 21 mil mulheres juntaram-se à corrida onde homem não entra (apesar de haver sempre quem tente subverter esta regra). A manhã deste domingo, 19 de maio, coloriu a Alameda das Antas de verde-claro, sinal de esperança e de apoio a uma causa: a luta contra o cancro da mama, que atinge, todos os anos, milhares de mulheres no nosso país.

 

Entrar em qualquer meio de transporte na (ou a caminho da) cidade do Porto neste domingo era embarcar na aventura mesmo antes dela começar: não havia autocarro, carruagem de metro ou composição de comboio que não transportasse uma mancha verde-água. Não, não eram os efeitos do tal meteoroide que iluminou os céus na noite anterior e muito menos eram restos da festa do Sporting, que, em casa, se consagrou campeão nacional de futebol no final de tarde de sábado.

 

O verde-água que compunha esta mancha era, afinal, sinal de desporto coletivo. Mais que isso, era sinal de solidariedade. Todos os caminhos iam dar à Alameda das Antas, local que tem acolhido, nos últimos anos, a Corrida da Mulher. Pouco depois das 09h00 eram já milhares as mulheres que faziam o aquecimento sob as ordens de um instrutor de fitness, ao som do músico Bruno Sax. “Direita, esquerda… Em cima, em baixo…. Quero ver todas com os braços no ar”.

 

 

Chegar cedo, nestas ocasiões, não é ter pressa demais para encontrar o melhor lugar; é saber que, ali, há atividades preparadas para acolher os milhares de mulheres que, todos os anos, respondem ao repto solidário da runporto para participar num evento que é muito mais que uma corrida: é um contributo para o trabalho do Instituto Português de Oncologia na luta contra o cancro da mama, flagelo que acomete muitas mulheres todos os anos.

 

 

Foi precisamente essa causa solidário que motivou Filomena Machado a participar pela primeira vez. “Nunca sabemos quando seremos nós a precisar deste apoio”, revela. De dorsal colocado, vai tentando seguir os passos que vê fazer, para ajudar os músculos a aquecer para os cinco quilómetros de corrida que se aproximam.

 

“Não tenho medo nenhum, lamento é não ter podido participar nas provas anteriores. E como estamos aqui por esta causa nobre e para ter uma manhã diferente, nada me assusta”, destaca.

 

Figuras conhecidas e objetivos traçados

 

Aos poucos vão chegando figuras de destaque na modalidade. Dulce Félix, de vermelho. Sara Moreira, que não desiste de correr mesmo que a vereação na Câmara de Santo Tirso a deixe com menos tempo para estas aventuras. Fernanda Ribeiro, a sempre madrinha destas provas. Jorge Gabriel, o padrinho-vedeta, a quem caberá dar o tiro de partida. Jorge Teixeira, o “dono disto tudo”. A hora aproxima-se e todas querem chegar o mais perto da meta, para serem as primeiras a partir – e, por consequência, aumentar as probabilidade de serem as primeiras a chegar.

 

 

É esta a ambição de Thamyna na Silva, de 22 anos, brasileira a viver em Portugal há cinco anos e “corredora profissional há um mês”. É a primeira vez que participa mas o objetivo é “ganhar”. Ficar em primeiro lugar, juntamente com a amiga Sílvia Fernandes, de 28 anos, que também ali está.

 

Por entre brincadeiras que ajudam a desanuviar algum nervosismo, lá vão dizendo que “a causa solidária vale tudo nestes encontros” e que uma arrastou a outra para participar na corrida. “É nestes momentos que também se consegue ver a energia das mulheres, todas unidas pelo desporto em prol de uma causa”, revela Sílvia.

 

 

Mas Thamyna vai ainda mais longe, a corrida que agora pratica “quase todos os dias” ajudou-a a ultrapassar alguns dramas internos, “como a ansiedade, o medo”. “Tenho conseguido gerir essas emoções e a nível emocional sinto-me mais estável”, assume. E para isso não basta ser um ás da estrada: basta correr “duas vezes por semana” e isso já ajuda.

 

Recorde batido em participações

 

Faltam poucos minutos para o tiro de partida. As irmãs Machado (Deolinda e Teresa) são de Vila Nova de Famalicão e, todos os anos, tentam não faltar a esta chamada. “Já costumamos fazer caminhadas e esta é uma forma que temos de fazer mais desporto”, destaca Deolinda, com a concordância da irmã: “o médico até nos manda fazer isto com regularidade, por isso é que vimos até cá”.

 

Antes de começar, a pergunta óbvia: o que se sente quando se acaba? “Um alívio, mas com um sentimento de felicidade”, dizem as duas, de viseiras colocadas e prontas para o tiro de partida.

 

 

É essa felicidade que se encontra em todos os rostos, nesta manhã de sol. A correr, a caminhar, com mais ou menos jeito, com mais ou menos ambição, o importante, neste caso, e sem clichés, é mesmo participar.

 

Na Alameda, há uma mancha humana a perder de vista. Contas oficiais apontam para mais de 21.500 participações neste ano – e tudo isto sem contar as presenças de última hora, os homens que se intrometem por entre uma corrida feminina e os filhos que, com as mães, querem experimentar este momento especial. Um recorde batido que enche de orgulho que, todos os anos, organiza este megaencontro.

 

Música e muita solidariedade

 

Quando o tiro de partida é dado, a voz de quem motiva manda que o sorriso esteja sempre nos lábios. Que os braços estejam no ar. Há beijinhos atirados ao apresentador de televisão que é padrinho da prova, há poses para os fotógrafos que registam a corrida, não há pressa em querer ultrapassar quem vai mais à frente.

 

Neste caso, a competição fica guardada para os clubes, que fazem a prova mais rápido, que tentar quebrar recordes e dar um treino diferente aos seus atletas. Porque aqui não se joga a sério, corre-se pelo amor à camisola e pelo amor ao desporto.

 

 

No final, a sorte sorriu a Ana Marinho, do C.D. S Salvador, com o tempo de 17’09; a Rafaela Fonseca, do R. D. Águeda, com 17’23; e a Dulce Félix, do Benfica, com 17’45.

 

Mas o maior prémio estava guardado para todas, no final: um miniconcerto de Paulo Ribeiro, dos Bandalusa, e do humorista-ator-apresentador-cantor João Paulo Rodrigues.

 

 

“Já venho há tantos anos que perdi a conta às edições”, conta-nos Olga Aleixo. “Mas venho porque saio daqui com o espírito livre”, finaliza.

 

É essa liberdade feminina, essa solidariedade sem igual que torna esta corrida única. No final, um cheque de quase 22 mil euros doado ao IPO do Porto compensa o esforço. A missão está cumprida.

 

Texto: José Reis

Fotos: Nuno Miguel Coelho

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