05/12/2023

Com os olhares de quem é da cidade a cruzarem-se com os de quem vive a cidade de passagem, a artista Raquel Belli constrói a sua história de um local que conhece apenas à superfície. “Caminhos Entrelaçados” ocupa desde outubro o outdoor instalado na Rua do General Sousa Dias, com vista para o Douro, depois do mesmo local ter sido intervencionado pelos artistas ±MaisMenos± (Miguel Januário) e pelo francês Rero, com a obra “I Have a Dream#”… “Not Today”. 

 

Como intervir num espaço público quando as referências que temos são pouco mais que duas viagens à cidade, um par de amigos com quem se troca meia dúzia de telefonemas por ano e um conjunto de símbolos (alguns comestíveis) que são universalmente conhecidos?  

 

Raquel Belli, a artista cuja obra nasceu em outubro na Rua do General Sousa Dias, revela que o conhecimento que tinha do Porto era relativamente “curto”. “Quando recebi o convite da [galeria] Underdogs e da Ágora, fiquei às ‘aranhas’. Não tenho qualquer ligação à cidade, tirando alguns amigos meus que trabalham cá”, assume. 

 

A proposta veio na sequência do ciclo de retratos que tinha iniciado em Lisboa – de onde é natural – tivesse uma “extensão” a norte. “Para isso peguei na máquina e fui passar uns dias ao Porto. Pensei em abordar as pessoas diretamente na rua e falar com elas”, ri Raquel. Mas a ideia mudou assim que colocou os pés em terra.  

 

 

“Conheci alguns artistas da cidade e desafiei-os a serem fotografados em paredes típicas do Porto e lugares mais ou menos icónicos”, admite. É por isso que encontramos, de forma meio dissimulada, os azulejos da Capela das Almas, os turistas que invadem a cidade todo o ano e os rostos que fazem do Porto uma cidade multicultural. 

 

“No fundo, o que fiz foi uma construção da imagem muito estética, com as várias montagens com imagens que fui captando. Nada é muito claro, mas para mim é muito singular a proposta que consta neste trabalho”, assume Raquel. Faz a simbiose dos ícones turísticos, dos turistas e dos moradores que, não sendo da cidade, a acolhem como casa-mãe. 

 

Ela que foi, durante uns dias, filha de uma terra que não a viu nascer. “Fiz tudo como um portuense faz: comi uma francesinha, comi uma bifana, bebi cerveja com amigos numa esplanada”, revela a autora, o que acabou por ajudar a entender melhor a cidade e sair daqui com renovadas memórias.  

 

Com este trabalho, o Programa de Arte Urbana do Porto ganha mais uma obra, “Caminhos Entrelaçados”, e Raquel Belli passa a figurar na lista dos artistas que fazem da cidade a sua tela.  

 

“Que a reação do público seja agora a melhor”, diz, esperançada. Porque, ali, o Porto dela poderá também ser o Porto de muitos. Pelo menos é isso que espera.  

 

Texto: José Reis

Fotos: Underdogs

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